Em áudio vazado, empresário reclama de repasse a desembargador: “Valor da p*”

Em áudios gravados durante uma reunião, empresários e políticos lamentaram o “alto valor” supostamente cobrado por promotores e desembargadores do Tribunal de Justiça de Alagoas. A conversa, registrada sem o conhecimento dos demais, ocorreu na Câmara Municipal de Coruripe (AL). No áudio, o grupo discute a partilha de valores provenientes da venda da safra de cana-de-açúcar de uma agroindústria local falida.

José Raimundo de Albuquerque Tavares, empresário e ex-prefeito de Junqueiro (AL), conversa com Joaquim Beltrão, ex-deputado federal e ex-prefeito de Coruripe, sobre a quantidade de pessoas envolvidas no processo de falência da Laginha Agroindustrial, avaliada em R$ 3 bilhões e com dívida fiscal e trabalhista de aproximadamente R$ 4 bilhões. A massa falida da indústria, que pertencia ao empresário e ex-deputado federal João Lyra, morto em 2021, inclui três usinas de açúcar e etanol.

Joaquim Beltrão comenta que ninguém buscou auxílio de promotores para resolver a situação e que os promotores possuem o “poder da caneta” para decidir sobre a produção de cana. Raimundo Tavares lamenta o custo elevado devido ao número de pessoas envolvidas: “É caro por isso. Muita gente comendo demais. É o promotor, é o administrador, é o povo de São Paulo, aí é Sandro, aí é desembargador, é filho de desembargador. Quando soma, é um valor da p*rra. É por isso que fica caro”. Os nomes dos desembargadores e promotores supostamente envolvidos não foram mencionados.

Em dezembro, a Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de Alagoas nomeou dois promotores para investigar o conteúdo da gravação.

Os áudios, datados de 21 de outubro de 2022, foram incluídos no processo de falência da Laginha, em tramitação no TJ-AL desde 2014. Para arrecadar fundos e amortizar as dívidas, os administradores da massa falida vendem a cana produzida nas terras da Laginha a outras usinas.

Desembargadores voltam atrás

O caso ganhou destaque quando 13 dos 17 desembargadores do Tribunal de Justiça de Alagoas se declararam impedidos de atuar no processo. Porém, após a possibilidade de a ação migrar para o STF, quatro magistrados voltaram atrás e se declararam aptos a julgar o processo. Entre eles estão Domingos de Araújo Lima Neto, Elisabeth Nascimento, Fábio José Araújo e Paulo Barros da Silva Lima. Assim, o TJ-AL decidiu que o caso continuará com o Judiciário alagoano.

Invasão

A disputa envolve a ocupação ilegal das terras da Usina Guaxuma, desativada após a falência do grupo. Joaquim Beltrão e um grupo de empresários são acusados de invadir as terras. Em setembro de 2022, a administração da massa falida lançou edital para venda da cana, prevendo a venda de 229 mil toneladas por R$ 34,7 milhões. A única indústria a aceitar a proposta foi a Impacto Bioenergia, que acordou em comprar a cana produzida pelos invasores, pagando duas vezes – à Laginha e aos invasores.

Uma planilha anexada ao processo revela que a área cultivada foi quase o dobro do previsto, com 439 mil toneladas de cana, arrecadando R$ 67,3 milhões. O excedente de R$ 61,3 milhões teria sido dividido pelo grupo de empresários, denominado “gangue”.

Os áudios mencionam também um intermediário que facilitava o contato entre o grupo e as autoridades.

Confronto com a polícia

Nos áudios, os invasores comentam um confronto com a polícia na safra anterior e reclamam da demora para o início da moagem da cana. “Depois de todo esse trabalho todinho, aqui no ano passado, nessa época, a gente já tinha o mesmo número de cana moída, com problema ou não, através da massa ou não, a gente já tinha”, diz um empresário não identificado. “Com polícia ou não, já tinha”, responde outro.

No dia 30 de maio, o Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) decidiu que o processo de falência da Laginha não será encaminhado ao STF. A solicitação ocorreu após 13 dos 17 desembargadores se declararem suspeitos para atuar no caso.